“À margem”
Triste caminheiro
Que percorres a passo lento
As ruas na noite escura;
Vacilas, teu andar é incerto
Ao dobrar de cada esquina.
Teu íntimo vai abalado
Como se para ti
O mundo houvesse acabado.
Tal como tantos és vítima
Do mundo que te gerou
Deste mundo sem sentido
De egoísmo vestido
A exibir sua vaidade
Da cabeça até aos pés.
Quem passa, olha-te
Sorri, lamenta-te:
“É um fraco, um infeliz
Um tristezeco, um nada
Um Zé-Ninguém…”
Todos se afastam de ti
E te tratam com desdém
Pelo que pensam que és:
Um pária da sociedade.
Insensíveis, ignorantes
Vazios de todo o saber
Não passam de reles pedantes
Com pretensões a querer ser…
Suportas em silêncio
As causas da tua dor
Dor que não se apalpa
Dor que não se vê
Essa dor que só sentem
Aqueles que amor não tiveram
Não te deixando viver
Os sonhos da tua infância
Sonhos que o berço embalou…
………
Abram-lhe as portas da vida!
Façam-lhe justiça
Que ele é vítima inocente
Dos que não sabem que o sonho
É o tesouro maior
Do homem que nasceu pobre.
Deixai-o viver!... Sonhar!...
Que o sonho é a maior riqueza
Que todo o vosso dinheiro
Não chega para comprar!
…………..
Mal eles sabem quanto vales
Caminheiro da noite escura
Que sorrindo intimamente
Continuas pela rua;
Chegas à esquina, dás a volta
Sem saberes que a noite é tua
Sem saberes que a noite é alta!
Gabriel Rito
Fevereiro de 1973